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A Influência Estrangeira e o Futuro do Futebol Brasileiro

Zico acendeu o debate ao criticar a crescente presença de jogadores e técnicos estrangeiros no Brasil, apontando perda de identidade e espaço para talentos locais. Mas será essa a verdadeira causa da crise?

Por Eduardo Vieira

25/03/2025 12h00 .- Opinião

Imagem: Rafael Ribeiro/CBF

No último dia 13, Zico, um dos maiores ídolos do futebol brasileiro, participou num seminário sobre os rumos do desporto no país, onde expressou a sua preocupação com a crescente presença de estrangeiros no futebol nacional. Segundo ele, os clubes do Brasil formam jogadores para vender, enquanto os talentos locais perdem espaço para atletas e técnicos vindos de fora. Para o ex-craque, a “invasão” estrangeira seria uma das razões para a perda de identidade do futebol brasileiro e para o declínio da formação de craques no país.

No entanto, essa visão, por mais respeitável que seja, ignora alguns aspetos fundamentais da evolução do futebol global. A presença de estrangeiros não é um problema exclusivo do Brasil, tampouco pode ser considerada a principal causa da crise na formação de talentos. Pelo contrário, as principais ligas do mundo, como a inglesa e a espanhola, cresceram exponencialmente nos últimos anos justamente por absorverem influências externas, elevando o seu nível técnico e tornando-se referências internacionais.

A evolução tática do “camisola 10”

Um dos pontos centrais da crítica de Zico é a ausência do clássico “camisola 10” brasileiro, outrora o símbolo do talento e da criatividade no futebol nacional. No entanto, essa mudança não é exclusiva do Brasil. O futebol moderno exige cada vez mais versatilidade dos jogadores, e a figura do “10 clássico” praticamente desapareceu do cenário mundial. Hoje, poucos jogadores atuam nessa posição tradicional, independentemente da nacionalidade.

Ao longo das décadas, as posições num jogo de futebol evoluíram diversas vezes para se adaptarem às novas tendências do jogo. Agora, simplesmente vemos essa evolução chegar à posição mais icónica do desporto-rei. Em vez da criatividade e engenhosidade oferecidas por craques como o próprio Zico, passou-se a exigir mais velocidade e intensidade dos médios, que já não possuem a mesma liberdade de espaço que lhes era fornecida anos atrás.

O papel dos treinadores estrangeiros

Outro ponto levantado por Zico é o impacto dos treinadores estrangeiros no Brasil. Ele sugere que os próprios técnicos brasileiros abriram espaço para essa “invasão” ao exportarem conhecimento para o exterior no passado. No entanto, a realidade atual mostra um cenário diferente.

É verdade que o Brasil já exportou nomes fundamentais para o desenvolvimento do jogo, como nos casos de Otto Glória (Benfica, Belenenses, Sporting, FC Porto e seleção portuguesa) e Otto Bumbel (FC Porto e Atlético de Madrid). Contudo, hoje, os principais representantes do Brasil no exterior são Sylvinho, na seleção da Albânia, e André Jardine, no América do México, muito aquém da influência que os brasileiros tiveram no passado. Enquanto outros grandes centros, como Portugal, Espanha e Argentina, dominam o cenário global, os treinadores brasileiros perderam relevância.

Além disso, a diferença de qualidade entre treinadores brasileiros e estrangeiros pode ser observada na forma como técnicos como Abel Ferreira e Artur Jorge, ambos sem grande prestígio na Europa, rapidamente se adaptaram e dominaram o futebol brasileiro. Esse desnível reflete não apenas a competência dos estrangeiros, mas também a estagnação dos treinadores locais.

Imagem: Rafael Ribeiro/CBF

O Brasil não produz mais craques?

As declarações de Zico reforçam uma crença comum entre os adeptos brasileiros: o Brasil já não forma grandes jogadores. Essa ideia, no entanto, não condiz com a realidade ou, pelo menos, não na sua totalidade.

Segundo uma análise publicada em 2024 pelo instituto suíço CIES, o país continua a ser o maior exportador de talentos do mundo. Na época analisada, havia 1.138 jogadores brasileiros a atuar fora do seu país, superando os franceses (1.091) e os argentinos (995). Entre estes, nomes como Vinícius Júnior e Rodrygo são peças-chave no Real Madrid, Raphinha destaca-se no Barcelona, e Alisson é considerado um dos melhores guarda-redes do mundo ao serviço do Liverpool. Além disso, nomes como Savinho (Manchester City) e Bruno Guimarães (Newcastle) consolidam-se como referências nas principais ligas europeias.

Embora seja verdade que o Brasil já não conta com nomes históricos como Ronaldo Nazário e Ronaldinho Gaúcho, afirmar que o país não produz mais grandes talentos é uma visão, no mínimo, distorcida. O problema não é a falta de craques, mas sim a incapacidade dos clubes brasileiros de manter esses talentos no país por mais tempo, devido às limitações financeiras e à estrutura de gestão do futebol nacional.

O verdadeiro problema

A questão central do declínio do futebol brasileiro não está na presença de estrangeiros, mas sim na má gestão dos clubes e na falta de um projeto sólido de formação de jogadores. A realidade é que os clubes brasileiros, na sua maioria, são financeiramente instáveis e mal administrados, o que dificulta qualquer tentativa de planeamento a longo prazo.

Se o Brasil quer voltar a formar grandes craques e ter técnicos de elite, o caminho não é reduzir a presença de estrangeiros, mas sim investir em infraestrutura, metodologias modernas de treino e gestão profissionalizada. Enquanto isso não acontecer, culpar a influência externa será apenas uma forma simplista de evitar discutir os verdadeiros problemas do futebol brasileiro.

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